Uma sociedade de eternos adolescentes?
Continua-se a estar sempre mais atingido pelo nivelamento das
gerações que se vê em rapazes e moças, jovens e adultos unidos por uma
mesma dinâmica: no modo de vestir, falar, se comportar, mas, sobretudo,
nas relações e na afetividade revelam-se muitas vezes as mesmas
dificuldades, até o ponto em que se torna difícil entender quem desses é
realmente o adulto. Ao mesmo tempo, preocupa a sempre maior difundida
fuga da responsabilidade, que leva a procrastinar indefinidamente as
escolhas de vida, iludindo-se de ter sempre intactos, diante de si,
todas as possibilidades.
Uma pesquisa da Istat[ii],
realizada em 2008 (e, por conseguinte, anterior à grave crise que
infelizmente levou ao desemprego milhares de jovens e de adultos),
revelava que mais de 70% das pessoas com idade entre 19 e 39 anos vivem
ainda com os pais. O motivo é também, mas não somente, econômico, já que
nessa faixa há pessoas com trabalho estável e uma renda que permitiria
viver de maneira independente.
As mesmas pesquisas mostram, além disso, que na Itália, mas também em
outros países da Europa, há um aumento preocupante de jovens/adultos
que pararam numa espécie de “limbo”, sem escolhas e sem perspectivas.
Essa situação abarca uma faixa etária sempre maior, ao ponto de ser
agora classificada como categoria sociológica, “a geração nem-nem”[iii].
Mas, principalmente, tal condição, não é vista como problemática pela
maioria das pessoas: “Há 270 mil jovens entre 15 e 19 anos que não
estudam e não trabalham (9%): a maior parte porque não encontra
trabalho; 50 mil porque fizeram de sua inatividade uma escolha; há ainda
11 mil que não querem saber de trabalhar ou estudar (“não me
interessa”, “não preciso”, dizem). A mesma tendência ocorre nos dados
relativos aos jovens entre 25 e 35 anos: um milhão e noventa mil não
estudam e não trabalham; ou seja, quase um quarto deles (25%). Um milhão
e duzentos mil desses gravitam no desemprego (mas entre estes últimos
há quem diga que não procura bem porque está “desanimado” ou porque “de
qualquer modo, o emprego não existe mesmo”). Setecentos mil são, ao
contrário, os “inativos convictos”: não procuram trabalho e não estão
dispostos a procurá-lo [...]. Uma pesquisa espanhola recente, assinada
pela sociedade Metroscopia, revela que 54% dos jovens da idade dos 18
aos 35 anos declara “não haver nenhum projeto sobre o qual desenvolver o
próprio interesse ou os próprios sonhos”[iv].
A essa situação de impasse e confusão acompanha uma
igualmente grave crise de autoridade e de normatividade que, como se
verá, constituem um dever educativo irrenunciável. Tal dever é rejeitado
por muitos motivos: porque esses que deveriam fazer valer a norma, os
adultos, não possuem a força, têm medo de parecerem impopulares ou,
muitas vezes, porque muitos não acreditam mais em ditas normas, vistas
somente como uma fonte de conflito e dificuldade.
Mas o aspecto talvez mais triste dessa carência seja que a norma que o adulto deveria estabelecer, vem a
faltar porque, às vezes, os mesmos educadores e pais se encontram
perdidos em problemas afetivos, relacionais, até mesmo de dependência. E
daí a crise profunda do adulto, com o risco de seu desaparecimento: “Se
um adulto é alguém que tenta assumir as consequências de seus atos e de
suas palavras [...], não podemos deixar de constatar um forte declínio
da sua presença na nossa sociedade [...]. Os adultos parecem estar
perdidos no mesmo mar onde se perderam os próprios filhos, sem qualquer
distinção de geração”[v].
Uma motivação possível, na origem dessa amálgama indiferenciada, pode
ser detectada no prolongamento da meia idade, própria das últimas
décadas e agravada devido à crise econômica atual, a qual não encoraja a
levar em consideração os custos e os esforços adicionais para
comprometer-se numa situação futura incerta. Além disso, a nova cultura
tecnológica contribui para confundir os limites entre a realidade e a
fantasia, que é a característica típica da criança. Já o havia
compreendido com lucidez Johan Huizinga no longínquo 1935: “[O homem
moderno] pode viajar de avião, falar com pessoas do outro hemisfério,
comprar guloseimas inserindo poucas moedas numa máquina automática
[...]. Aperta um botão, e a vida cai aos seus pés. Pode tal vida
torná-lo emancipado? Ao contrário. A vida para ele tornou-se um
brinquedo. É de se espantar que ele se comporte como uma criança?”[vi].
Tradução ao português:
Pe. Anderson Alves e Joyce Scoralick.
[i] Artigo publicado em La Civiltà Cattolica, II 220-232, caderno 3885 (5 de maio de 2012).
[ii] Istat é o instituto nacional de estatísticas, um ente de pesquisas públicas na Itália (nota do tradutor).
[iii] Assim traduzimos à expressão italiana “generazione né-né”, que quer se referir àquelas pessoas que nem estudam, nem trabalham (Nota do tradutor).
[iv] MANGIAROTTI, A. Generazione “né-né”. Settecentomilla giovani “inattivi convinti” In: Corrieri della Serra, 16 de julho de 2009, p. 25.
[v] RECALCATI, M. Dove sono finiti gli adulti? In: La Repubblica, 19 de fevereiro de 2012, p. 56. O recente filme 17 ragazze (17 moças)
(de Delphine e Muriel Coulin) inspirado no fato real de um grupo de
adolescentes estadunidenses, unidas por um pacto comum, de ficarem ao
mesmo tempo grávidas, apresenta ao mesmo tempo toda a
dificuldade do mundo adulto (na escola como na família) a compreender o
desconforto dessas jovens, por estarem com os mesmos problemas não
resolvidos.
[vi] HUIZINGA, J. La crisi della civiltà. Totino, Einaudi, 1962, p. 115.
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