
Renato Varges, Professor universitário
Eu
precisava desabafar depois de ler as palavras do presidente do Conselho
Federal de Medicina: “Somos a favor da vida, mas queremos respeitar a
autonomia da mulher que, até a 12ª semana, já tomou a decisão de
praticar a interrupção da gravidez”. (Dr. Roberto Luiz d´Avila)
O
que talvez o Dr. Roberto tenha esquecido é que o Principio Bioético da
Autonomia diz respeito ao “autogoverno, autodeterminação da pessoa em
tomar decisões relacionadas a SUA vida, SUA saúde, SUA integridade
físico-psiquíca e SUAS relações sociais”. (Fiz questão de citar a
definição oferecida pelo próprio site do CFM, mesmo havendo melhores
definições em fontes mais ricas).
A
Autonomia da mãe não é absoluta e não lhe dá direito sobre uma vida
que, geneticamente, fisiologicamente e ontologicamente não é a sua!
Se
a opção é justificar o aborto partindo de um princípio da bioética, o
Dr. Roberto escolheu muito mal, pois qualquer pessoa de boa vontade
entende, sem dificuldade, que o corpo de uma criança no ventre de uma
mulher não é e não pertence à mulher. A reconhecida dependência feto-mãe
não garante à mãe direito absoluto sobre o corpo do feto, pois se o
conceito relativizado de dependência for utilizado para nortear a
discussão, justifica-se também a morte de fetos com oito meses de
gestação ou neonatos lactentes, afinal possuem também um grau de
dependência.
A
dependência de um feto em relação à sua mãe não anula sua independência
ontológica, pois ele é um ser humano que existe e não é o ser da mãe.
Quem
responderá por ele senão sua própria dignidade enquanto vida humana
indefesa? Portanto, se vamos clamar pela autonomia, lembremos que
existem duas vidas humanas envolvidas no caso, mãe e filho. Se a mãe
clama pela autonomia de querer “interromper a gravidez” (matar), o filho
tem vida humana e clama pela autonomia de querer viver! Vamos
relativizar a vida humana, atribuindo-lhe valor circunstancial e voltar
ao eugenismo nazista? É isso?
É
claro que a mãe, como responsável pelo filho incapaz, tem voz de
decisão sobre a vida dele. No entanto, não estamos falando aqui de uma
criança que não pode assinar um Consentimento Livre e Esclarecido para
passar por uma intervenção cirúrgica de risco e para isso conta com o
amparo materno para saber até onde deve colocar a vida do próprio filho
em risco. Estamos falando de um ser incapaz sim, mas em pleno gozo de
saúde e que não precisa que sua mãe assuma o papel de responsável pela
sua morte sem uma justificativa ou obrigação invencível. Se morrer,
morrerá a toa, sem que isso seja um benefício real para alguém!
O
segundo argumento é que até 12 semanas “interromper a gravidez”
(assassinato) é menos arriscado para a mulher e o “produto da
fecundação” (termo que ele estranhamente não usou ao referir-se à
criança) ainda não possui “sistema nervoso central completamente
formado”.
Aqui
seria importante lembrarmos outro princípio da bioética, o da
Beneficência (junto à Não Maleficência), sem o qual o princípio da
autonomia torna-se cego e arriscado (vide casos de transfusões em
Testemunhos de Jeová). O principio da Beneficência, que inclusive
norteia o juramento hipocrático que todos os médicos fazem, consiste em
“usar o tratamento para fazer o bem, segundo minha capacidade e juízo,
mas nunca para fazer o mal e a injustiça”. Ou seja, nesse caso o
princípio de não fazer mal à mulher seria uma alegação válida, mas o de
não fazer mal a outra vida humana indefesa e inocente, não seria valido?
Desta forma, Autonomia e Beneficência passariam a pertencer a uma ética
míope, tendenciosa e, diria, imoral!
Além
disso, qual a fundamentação biológica para definir que a formação
completa do SNC é o evento que determina o início da vida?
Um ser humano
desenvolve-se continua e ininterruptamente a partir da fecundação e se
nada INTERROMPER este processo, tudo ao seu tempo passará a funcionar de
acordo com a necessidade e a determinação genética da sua natureza.
Todo ser humano está geneticamente orientado para um desenvolvimento
contínuo e integral, numa seqüência de eventos moleculares que ocorrem
cada um ao seu tempo e independentes da mãe. Da mesma forma que um recém
nascido não tem e não necessita ter pelos, dentes…,um embrião ainda não
necessita de seu SNC maduro para viver, pois isso não lhe compromete a
vida, no entanto ele precisa por exemplo do coração funcional e por isso
já o possui, batendo vigoroso e acelerado desde os primeiros dias da
sua existência.
O
que determina o início da vida então? O coração batendo? Os dentes
nascendo? O SNC maduro? A fecundação? Uma resposta honesta deve fugir do
campo dos conceitos e firmar-se no campo biológico, fora do alcance
tirano dos interessados na morte, especialmente porque já tiveram o
direito de nascer preservado.
Mas,
no fundo, no fundo… O problema é que não se trata aqui de argumentos
inteligentes, lógicos e coerentes. Eles só convencem quem não precisa
ser convencido! A esmagadora maioria emudecida de nossa população
repudia o aborto, mas é uma maioria amordaçada, sem voto, sem microfone,
sem voz e sem vez.
Portanto,
toda argumentação sobre a defesa da vida não vai mudar a agenda que a
ONU impôs aos países latino-americanos. Não mudou no Uruguai, não mudou
na Argentina e trágica e desgraçadamente não vai mudar no Brasil.
Apesar
do CFM dizer que estão apenas assumindo uma posição e quem legisla é
quem fala pelo povo, isso é mentira! O
legislativo não fala pelos interesses do povo, mas pelos interesses de
uma minoria que tem dinheiro e poder e por isso manda e desmanda em
nosso país. Quando se trata de obedecer às grandes fundações,
quando se trata de montantes de trilhões de dólares, tudo tem um preço,
até mesmo a verdade fundamental das palavras, que nas mãos dos poderosos
passam a valer o quanto pesam, ou melhor, passam a pesar o quanto
valem.
Assim,
quando os interesses são impostos, mudam-se os conceitos, distorcem-se
as palavras, ajeitam-se os termos e a mascaram-se as manchetes……Neste
contexto, ordem é tudo que estiver ao alcance de um jeitinho, progresso é
autodestruição anestesiada pelo poder, prazer e possuir; a medicina é
uma eugenia disfarçada, úteros são sepulcros decorados de egoísmo, a
gravidez é a injustiça de uma criança carrasca com sua mãe indefesa, que
solicita matar o que seu corpo foi criado e ordenado para proteger,
tornando a beleza da gestação um gélido velório e a maternidade um
exercício nazista que maquia a morte de vida.
E
assim, sem ter muito trabalho de ler e pensar, muita coisa a gente faz,
seguindo o caminho que o mundo traçou, seguindo a cartilha que alguém
ensinou, seguindo a receita da vida normal… vamos estupida e
soberbamente destruindo, com ares de sabedoria e evolução, aquilo que de
mais precioso possuímos…a dignidade da vida humana.
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