Catequese do Papa Francisco na primeira Audiência Geral do pontificado
Apresentamos a tradução da
primeira catequese do Papa Francisco realizada nesta quarta-feira, 27 de março,
na Praça de São Pedro.
Irmãos e irmãs, bom dia!
Tenho o prazer de acolher-vos nesta minha primeira Audiência
Geral. Com grande reconhecimento e veneração acolho o “testemunho” das mãos do
meu amado predecessor Bento XVI. Depois da Páscoa retomaremos as catequeses do
Ano da Fé. Hoje gostaria de concentrar-me um pouco sobre a Semana Santa.
Com o
Domingo de Ramos iniciamos esta Semana – centro de todo o Ano Litúrgico – na
qual acompanhamos Jesus em sua Paixão, Morte e Ressurreição.
Mas o que pode querer dizer viver a Semana Santa para nós? O que
significa seguir Jesus em seu caminho no Calvário para a Cruz e a ressurreição?
Em sua missão terrena, Jesus percorreu os caminhos da Terra Santa; chamou 12
pessoas simples para que permanecessem com Ele, compartilhando o seu caminho e
para que continuassem a sua missão; escolheu-as entre o povo cheio de fé nas
promessas de Deus. Falou a todos, sem distinção, aos grandes e aos humildes, ao
jovem rico e à pobre viúva, aos poderosos e aos indefesos; levou a misericórdia
e o perdão de Deus; curou, consolou, compreendeu; doou esperança; levou a todos
a presença de Deus que se interessa por cada homem e cada mulher, como faz um
bom pai e uma boa mãe para cada um de seus filhos.
Deus não esperou que
fôssemos a Ele, mas foi Ele que se moveu para nós, sem cálculos, sem medidas.
Deus é assim: Ele dá sempre o primeiro passo, Ele se move para nós. Jesus viveu
a realidade cotidiana do povo mais comum: comoveu-se diante da multidão que
parecia um rebanho sem pastor; chorou diante do sofrimento de Marta e Maria
pela morte do irmão Lázaro; chamou um cobrador de impostos como seu discípulo;
sofreu também a traição de um amigo. Nele Deus nos doou a certeza de que está
conosco, em meio a nós. “As raposas – disse Ele, Jesus – as raposas têm suas
tocas e as aves do céu os seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde
repousar a cabeça” (Mt 8, 20).
Jesus não tem casa porque a sua casa é o povo,
somos nós, a sua missão é abrir a todos as portas de Deus, ser a presença do
amor de Deus.
Na Semana Santa nós vivemos o ápice deste momento, deste plano de
amor que percorre toda a história da relação entre Deus e a humanidade. Jesus
entra em Jerusalém para cumprir o último passo, no qual reassume toda a sua
existência: doa-se totalmente, não tem nada para si, nem mesmo a vida. Na
Última Ceia, com os seus amigos, compartilha o pão e distribui o cálice “por
nós”. O Filho de Deus se oferece a nós, entrega em nossas mãos o seu Corpo e o
seu Sangue para estar sempre conosco, para morar em meio a nós. E no Monte das
Oliveiras, como no processo diante de Pilatos, não oferece resistência, doa-se;
é o Servo sofredor profetizado por Isaías que se despojou até a morte (cfr Is
53,12).
Jesus não vive este amor que conduz ao sacrifício de modo passivo
ou como um destino fatal; certamente não esconde a sua profunda inquietação
humana diante da morte violenta, mas se confia com plena confiança ao Pai.
Jesus entregou-se voluntariamente à morte para corresponder ao amor de Deus
Pai, em perfeita união com a sua vontade, para demonstrar o seu amor por nós.
Na cruz Jesus “me amou e entregou a si mesmo” (Gal 2,20). Cada um de nós pode
dizer: amou-me e entregou a si mesmo por mim. Cada um pode dizer este “por
mim”.
O que significa tudo isto para nós? Significa que este é também o
meu, o teu, o nosso caminho. Viver a Semana Santa seguindo Jesus não somente
com a emoção do coração; viver a Semana Santa seguindo Jesus quer dizer
aprender a sair de nós mesmos – como disse domingo passado – para ir ao
encontro dos outros, para ir para as periferias da existência, mover-nos
primeiro para os nossos irmãos e as nossas irmãs, sobretudo aqueles mais
distantes, aqueles que são esquecidos, aqueles que tema mais necessidade de compreensão,
de consolação, de ajuda. Há tanta necessidade de levar a presença viva de Jesus
misericordioso e rico de amor!
Viver a Semana Santa é entrar sempre mais na lógica de Deus, na
lógica da Cruz, que não é antes de tudo aquela da dor e da morte, mas aquela do
amor e da doação de si que traz vida. É entrar na lógica do Evangelho. Seguir,
acompanhar Cristo, permanecer com Ele exige um “sair”, sair. Sair de si mesmo,
de um modo cansado e rotineiro de viver a fé, da tentação de fechar-se nos
próprios padrões que terminam por fechar o horizonte da ação criativa de Deus.
Deus saiu de si mesmo para vir em meio a nós, colocou a sua tenda entre nós
para trazer-nos a sua misericórdia que salva e doa esperança. Também nós, se
desejamos segui-Lo e permanecer com Ele, não devemos nos contentar em
permanecer no recinto das 99 ovelhas, devemos “sair”, procurar com Ele a ovelha
perdida, aquela mais distante. Lembrem-se bem: sair de nós mesmo, como Jesus,
como Deus saiu de si mesmo em Jesus e Jesus saiu de si mesmo por todos nós.
Alguém poderia dizer-me: “Mas, padre, não tenho tempo”, “tenho
tantas coisas a fazer”, “é difícil”, “o que posso fazer com as minhas poucas
forças, também com o meu pecado, com tantas coisas?”.
Sempre nos contentamos
com alguma oração, com uma Missa dominical distraída e não constante, com
qualquer gesto de caridade, mas não temos esta coragem de “sair” para levar
Cristo. Somos um pouco como São Pedro. Assim que Jesus fala de paixão, morte e
ressurreição, de doação de si, de amor para todos, o Apóstolo o leva para o
lado e o repreende. Aquilo que diz Jesus perturba os seus planos, parece
inaceitável, coloca em dificuldade as seguranças que se havia construído, a sua
ideia de Messias. E Jesus olha para os discípulos e dirige a Pedro talvez uma
das palavras mais duras dos Evangelhos: “Afasta-te de mim, Satanás, porque teus
sentimentos não são os de Deus, mas os dos homens” (Mc 8, 33). Deus pensa
sempre com misericórdia: não se esqueçam disso. Deus pensa sempre com
misericórdia: é o Pai misericordioso! Deus pensa como o pai que espera o
retorno do filho e vai ao seu encontro, vê-lo vir quando ainda é distante…O que
isto significa? Que todos os dias ia ver se o filho retornava a casa: este é o
nosso Pai misericordioso. É o sinal que o esperava de coração no terraço de sua
casa. Deus pensa como o samaritano que não passa próximo à vítima olhando por
outro lado, mas socorrendo-a sem pedir nada em troca; sem perguntar se era
judeu, se era pagão, se era samaritano, se era rico, se era pobre: não pergunta
nada. Não pergunta essas coisas, não pergunta nada. Vai em seu auxílio: assim é
Deus. Deus pensa como o pastor que doa a sua vida para defender e salvar as
ovelhas.
A Semana Santa é um tempo de graça que o Senhor nos doa para abrir
as portas do nosso coração, da nossa vida, das nossas paróquias – que pena
tantas paróquias fechadas! – dos movimentos, das associações, e “sair” de
encontro aos outros, fazer-nos próximos para levar a luz e a alegria da nossa
fé.
Sair sempre! E isto com amor e com a ternura de Deus, no respeito e na
paciência, sabendo que nós colocamos as nossas mãos, os nossos pés, o nosso
coração, mas em seguida é Deus que os orienta e torna fecunda cada ação nossa.
Desejo a todos viver bem estes dias seguindo o Senhor com coragem,
levando em nós mesmos um raio do seu amor a quantos encontrarmos.
(Após a catequese)
Queridos peregrinos de língua portuguesa, particularmente os
grupos de jovens vindos de Portugal e do Brasil: sede bem-vindos! Desejo-vos
uma Semana Santa abençoada, seguindo o Senhor com coragem e levando a quantos
encontrardes o testemunho luminoso do seu amor. A todos dou a Bênção
Apostólica!
Tradução: Canção Nova
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