
MENSAGEM
DIA MUNDIAL DA PAZ
1º DE JANEIRO DE 2013
BEM-AVENTURADOS OS OBREIROS DA PAZ
1.
Cada ano novo traz consigo a expectativa de um mundo melhor. Nesta
perspectiva, peço a Deus, Pai da humanidade, que nos conceda a concórdia
e a paz a fim de que possam tornar-se realidade, para todos, as
aspirações duma vida feliz e próspera.
À distância de 50 anos do
início do Concílio Vaticano II, que permitiu dar mais força à missão da
Igreja no mundo, anima constatar como os cristãos, Povo de Deus em
comunhão com Ele e caminhando entre os homens, se comprometem na
história compartilhando alegrias e esperanças, tristezas e angústias,
anunciando a salvação de Cristo e promovendo a paz para todos.
Na
realidade o nosso tempo, caracterizado pela globalização, com seus
aspectos positivos e negativos, e também por sangrentos conflitos ainda
em curso e por ameaças de guerra, requer um renovado e concorde empenho
na busca do bem comum, do desenvolvimento de todo o homem e do homem
todo.
Causam apreensão os focos de tensão e conflito causados por
crescentes desigualdades entre ricos e pobres, pelo predomínio duma
mentalidade egoísta e individualista que se exprime inclusivamente por
um capitalismo financeiro desregrado. Além de variadas formas de
terrorismo e criminalidade internacional, põem em perigo a paz aqueles
fundamentalismos e fanatismos que distorcem a verdadeira natureza da
religião, chamada a favorecer a comunhão e a reconciliação entre os
homens.
E no entanto as inúmeras obras de paz, de que é rico o
mundo, testemunham a vocação natural da humanidade à paz. Em cada
pessoa, o desejo de paz é uma aspiração essencial e coincide, de certo
modo, com o anelo por uma vida humana plena, feliz e bem sucedida. Por
outras palavras, o desejo de paz corresponde a um princípio moral
fundamental, ou seja, ao dever-direito de um desenvolvimento integral,
social, comunitário, e isto faz parte dos desígnios que Deus tem para o
homem. Na verdade, o homem é feito para a paz, que é dom de Deus.
Tudo
isso me sugeriu buscar inspiração, para esta Mensagem, às palavras de
Jesus Cristo: «Bem--aventurados os obreiros da paz, porque serão
chamados filhos de Deus» (Mt 5, 9).
A bem-aventurança evangélica
2.
As bem-aventuranças proclamadas por Jesus (cf. Mt 5, 3-12; Lc 6, 20-23)
são promessas. Com efeito, na tradição bíblica, a bem-aventurança é um
género literário que traz sempre consigo uma boa nova, ou seja um
evangelho, que culmina numa promessa. Assim, as bem-aventuranças não são
meras recomendações morais, cuja observância prevê no tempo devido – um
tempo localizado geralmente na outra vida – uma recompensa, ou seja,
uma situação de felicidade futura; mas consistem sobretudo no
cumprimento duma promessa feita a quantos se deixam guiar pelas
exigências da verdade, da justiça e do amor. Frequentemente, aos olhos
do mundo, aqueles que confiam em Deus e nas suas promessas aparecem como
ingénuos ou fora da realidade; ao passo que Jesus lhes declara que já
nesta vida – e não só na outra – se darão conta de serem filhos de Deus e
que, desde o início e para sempre, Deus está totalmente solidário com
eles. Compreenderão que não se encontram sozinhos, porque Deus está do
lado daqueles que se comprometem com a verdade, a justiça e o amor.
Jesus, revelação do amor do Pai, não hesita em oferecer-Se a Si mesmo em
sacrifício. Quando se acolhe Jesus Cristo, Homem-Deus, vive-se a
jubilosa experiência de um dom imenso: a participação na própria vida de
Deus, isto é, a vida da graça, penhor duma vida plenamente feliz. De
modo particular, Jesus Cristo dá-nos a paz verdadeira, que nasce do
encontro confiante do homem com Deus.
A bem-aventurança de Jesus
diz que a paz é, simultaneamente, dom messiânico e obra humana. Na
verdade, a paz pressupõe um humanismo aberto à transcendência; é fruto
do dom recíproco, de um mútuo enriquecimento, graças ao dom que provém
de Deus e nos permite viver com os outros e para os outros. A ética da
paz é uma ética de comunhão e partilha. Por isso, é indispensável que as
várias culturas de hoje superem antropologias e éticas fundadas sobre
motivos teorico-práticos meramente subjectivistas e pragmáticos, em
virtude dos quais as relações da convivência se inspiram em critérios de
poder ou de lucro, os meios tornam-se fins, e vice-versa, a cultura e a
educação concentram-se apenas nos instrumentos, na técnica e na
eficiência. Condição preliminar para a paz é o desmantelamento da
ditadura do relativismo e da apologia duma moral totalmente autónoma,
que impede o reconhecimento de quão imprescindível seja a lei moral
natural inscrita por Deus na consciência de cada homem. A paz é
construção em termos racionais e morais da convivência, fundando-a sobre
um alicerce cuja medida não é criada pelo homem, mas por Deus. Como
lembra o Salmo 29, « o Senhor dá força ao seu povo; o Senhor abençoará o
seu povo com a paz » (v. 11).
A paz: dom de Deus e obra do homem
3.
A paz envolve o ser humano na sua integridade e supõe o empenhamento da
pessoa inteira: é paz com Deus, vivendo conforme à sua vontade; é paz
interior consigo mesmo, e paz exterior com o próximo e com toda a
criação. Como escreveu o Beato João XXIII na Encíclica Pacem in terris –
cujo cinquentenário terá lugar dentro de poucos meses –, a paz implica
principalmente a construção duma convivência humana baseada na verdade,
na liberdade, no amor e na justiça.A negação daquilo que constitui a
verdadeira natureza do ser humano, nas suas dimensões essenciais, na sua
capacidade intrínseca de conhecer a verdade e o bem e, em última
análise, o próprio Deus, põe em perigo a construção da paz. Sem a
verdade sobre o homem, inscrita pelo Criador no seu coração, a liberdade
e o amor depreciam-se, a justiça perde a base para o seu exercício.
Para
nos tornarmos autênticos obreiros da paz, são fundamentais a atenção à
dimensão transcendente e o diálogo constante com Deus, Pai
misericordioso, pelo qual se implora a redenção que nos foi conquistada
pelo seu Filho Unigénito. Assim o homem pode vencer aquele germe de
obscurecimento e negação da paz que é o pecado em todas as suas formas:
egoísmo e violência, avidez e desejo de poder e domínio, intolerância,
ódio e estruturas injustas.
A realização da paz depende sobretudo
do reconhecimento de que somos, em Deus, uma única família humana.
Esta, como ensina a Encíclica Pacem in terris, está estruturada mediante
relações interpessoais e instituições sustentadas e animadas por um
«nós» comunitário, que implica uma ordem moral, interna e externa, na
qual se reconheçam sinceramente, com verdade e justiça, os próprios
direitos e os próprios deveres para com os demais. A paz é uma ordem de
tal modo vivificada e integrada pelo amor, que se sentem como próprias
as necessidades e exigências alheias, que se fazem os outros
comparticipantes dos próprios bens e que se estende sempre mais no mundo
a comunhão dos valores espirituais. É uma ordem realizada na liberdade,
isto é, segundo o modo que corresponde à dignidade de pessoas que,
porsua própria natureza racional, assumem a responsabilidade do próprio
agir.
A paz não é um sonho, nem uma utopia; a paz é possível. Os
nossos olhos devem ver em profundidade, sob a superfície das aparências e
dos fenómenos, para vislumbrar uma realidade positiva que existe nos
corações, pois cada homem é criado à imagem de Deus e chamado a crescer
contribuindo para a edificação dum mundo novo. Na realidade, através da
encarnação do Filho e da redenção por Ele operada, o próprio Deus entrou
na história e fez surgir uma nova criação e uma nova aliança entre Deus
e o homem (cf. Jr 31, 31-34), oferecendo-nos a possibilidade de ter «
um coração novo e um espírito novo » (cf. Ez 36, 26).
Por isso
mesmo, a Igreja está convencida de que urge um novo anúncio de Jesus
Cristo, primeiro e principal factor do desenvolvimento integral dos
povos e também da paz. Na realidade, Jesus é a nossa paz, a nossa
justiça, a nossa reconciliação (cf. Ef 2, 14; 2 Cor 5, 18). O obreiro da
paz, segundo a bem--aventurança de Jesus, é aquele que procura o bem do
outro, o bem pleno da alma e do corpo, no tempo presente e na
eternidade.
A partir deste ensinamento, pode-se deduzir que cada
pessoa e cada comunidade – religiosa, civil, educativa e cultural – é
chamada a trabalhar pela paz. Esta consiste, principalmente, na
realização do bem comum das várias sociedades, primárias e intermédias,
nacionais, internacionais e a mundial. Por isso mesmo, pode-se supor que
os caminhos para a implementação do bem comum sejam também os caminhos
que temos de seguir para se obter a paz.
Obreiros da paz são aqueles que amam,defendem e promovem a vida na sua integridade
4.
Caminho para a consecução do bem comum e da paz é, antes de mais nada, o
respeito pela vida humana, considerada na multiplicidade dos seus
aspectos, a começar da concepção, passando pelo seu desenvolvimento até
ao fim natural. Assim, os verdadeiros obreiros da paz são aqueles que
amam, defendem e promovem a vida humana em todas as suas dimensões:
pessoal, comunitária e transcendente. A vida em plenitude é o ápice da
paz. Quem deseja a paz não pode tolerar atentados e crimes contra a
vida.
Aqueles que não apreciam suficientemente o valor da vida
humana, chegando a defender, por exemplo, a liberalização do aborto,
talvez não se dêem conta de que assim estão a propor a prossecução duma
paz ilusória. A fuga das responsabilidades, que deprecia a pessoa
humana, e mais ainda o assassinato de um ser humano indefeso e inocente
nunca poderão gerar felicidade nem a paz. Na verdade, como se pode
pensar em realizar a paz, o desenvolvimento integral dos povos ou a
própria salvaguarda do ambiente, sem estar tutelado o direito à vida dos
mais frágeis, a começar pelos nascituros? Qualquer lesão à vida, de
modo especial na sua origem, provoca inevitavelmente danos irreparáveis
ao desenvolvimento, à paz, ao ambiente. Tão pouco é justo codificar
ardilosamente falsos direitos ou opções que, baseados numa visão
redutiva e relativista do ser humano e com o hábil recurso a expressões
ambíguas tendentes a favorecer um suposto direito ao aborto e à
eutanásia, ameaçam o direito fundamental à vida.
Também a
estrutura natural do matrimónio, como união entre um homem e uma mulher,
deve ser reconhecida e promovida contra as tentativas de a tornar,
juridicamente, equivalente a formas radicalmente diversas de união que,
na realidade, a prejudicam e contribuem para a sua desestabilização,
obscurecendo o seu carácter peculiar e a sua insubstituível função
social.
Estes princípios não são verdades de fé, nem uma mera
derivação do direito à liberdade religiosa; mas estão inscritos na
própria natureza humana – sendo reconhecíveis pela razão – e
consequentemente comuns a toda a humanidade. Por conseguinte, a acção da
Igreja para os promover não tem carácter confessional, mas dirige-se a
todas as pessoas, independentemente da sua filiação religiosa. Tal acção
é ainda mais necessária quando estes princípios são negados ou mal
entendidos, porque isso constitui uma ofensa contra a verdade da pessoa
humana, uma ferida grave infligida à justiça e à paz.
Por isso,
uma importante colaboração para a paz é dada também pelos ordenamentos
jurídicos e a administração da justiça quando reconhecem o direito ao
uso do princípio da objecção de consciência face a leis e medidas
governamentais que atentem contra a dignidade humana, como o aborto e a
eutanásia.
Entre os direitos humanos basilares mesmo para a vida
pacífica dos povos, conta-se o direito dos indivíduos e comunidades à
liberdade religiosa. Neste momento histórico, torna-se cada vez mais
importante que este direito seja promovido não só negativamente, como
liberdade de – por exemplo, de obrigações e coacções quanto à liberdade
de escolher a própria religião –, mas também positivamente, nas suas
várias articulações, como liberdade para: por exemplo, para testemunhar a
própria religião, anunciar e comunicar a sua doutrina; para realizar
actividades educativas, de beneficência e de assistência que permitem
aplicar os preceitos religiosos; para existir e actuar como organismos
sociais, estruturados de acordo com os princípios doutrinais e as
finalidades institucionais que lhe são próprias. Infelizmente vão-se
multiplicando, mesmo em países de antiga tradição cristã, os episódios
de intolerância religiosa, especialmente contra o cristianismo e aqueles
que se limitam a usar os sinais identificadores da própria religião.
O
obreiro da paz deve ter presente também que as ideologias do
liberalismo radical e da tecnocracia insinuam, numa percentagem cada vez
maior da opinião pública, a convicção de que o crescimento económico se
deve conseguir mesmo à custa da erosão da função social do Estado e das
redes de solidariedade da sociedade civil, bem como dos direitos e
deveres sociais. Ora, há que considerar que estes direitos e deveres são
fundamentais para a plena realização de outros, a começar pelos
direitos civis e políticos.
E, entre os direitos e deveres
sociais actualmente mais ameaçados, conta-se o direito ao trabalho. Isto
é devido ao facto, que se verifica cada vez mais, de o trabalho e o
justo reconhecimento do estatuto jurídico dos trabalhadores não serem
adequadamente valorizados, porque o crescimento económico dependeria
sobretudo da liberdade total dos mercados. Assim o trabalho é
considerado uma variável dependente dos mecanismos económicos e
financeiros. A propósito disto, volto a afirmar que não só a dignidade
do homem mas também razões económicas, sociais e políticas exigem que se
continue « a perseguir como prioritário o objectivo do acesso ao
trabalho para todos, ou da sua manutenção ».4 Para se realizar este
ambicioso objectivo, é condição preliminar uma renovada apreciação do
trabalho, fundada em princípios éticos e valores espirituais, que
revigore a sua concepção como bem fundamental para a pessoa, a família, a
sociedade. A um tal bem corresponde um dever e um direito, que exigem
novas e ousadas políticas de trabalho para todos.
Construir o bem da paz através de um novo modelo de desenvolvimento e de economia
5.
De vários lados se reconhece que, hoje, é necessário um novo modelo de
desenvolvimento e também uma nova visão da economia. Quer um
desenvolvimento integral, solidário e sustentável, quer o bem comum
exigem uma justa escala de bens-valores, que é possível estruturar tendo
Deus como referência suprema. Não basta ter à nossa disposição muitos
meios e muitas oportunidades de escolha, mesmo apreciáveis; é que tanto
os inúmeros bens em função do desenvolvimento como as oportunidades de
escolha devem ser empregues de acordo com a perspectiva duma vida boa,
duma conduta recta, que reconheça o primado da dimensão espiritual e o
apelo à realização do bem comum. Caso contrário, perdem a sua justa
valência, acabando por erguer novos ídolos.
Para sair da crise
financeira e económica actual, que provoca um aumento das desigualdades,
são necessárias pessoas, grupos, instituições que promovam a vida,
favorecendo a criatividade humana para fazer da própria crise uma
ocasião de discernimento e de um novo modelo económico. O modelo que
prevaleceu nas últimas décadas apostava na busca da maximização do lucro
e do consumo, numa óptica individualista e egoísta que pretendia
avaliar as pessoas apenas pela sua capacidade de dar resposta às
exigências da competitividade. Olhando de outra perspectiva, porém, o
sucesso verdadeiro e duradouro pode ser obtido com a dádiva de si mesmo,
dos seus dotes intelectuais, da própria capacidade de iniciativa, já
que o desenvolvimento económico suportável, isto é, autenticamente
humano tem necessidade do princípio da gratuidade como expressão de
fraternidade e da lógica do dom. Concretamente na actividade económica, o
obreiro da paz aparece como aquele que cria relações de lealdade e
reciprocidade com os colaboradores e os colegas, com os clientes e os
usuários. Ele exerce a actividade económica para o bem comum, vive o seu
compromisso como algo que ultrapassa o interesse próprio, beneficiando
as gerações presentes e futuras. Deste modo sente-se a trabalhar não só
para si mesmo, mas também para dar aos outros um futuro e um trabalho
dignos.
No âmbito econômico, são necessárias – especialmente por
parte dos Estados – políticas de desenvolvimento industrial e agrícola
que tenham a peito o progresso social e a universalização de um Estado
de direito e democrático. Fundamental e imprescindível é também a
estruturação ética dos mercados monetário, financeiro e comercial; devem
ser estabilizados e melhor coordenados e controlados, de modo que não
causem dano aos mais pobres. A solicitude dos diversos obreiros da paz
deve ainda concentrar-se – com mais determinação do que tem sido feito
até agora – na consideração da crise alimentar, muito mais grave do que a
financeira. O tema da segurança das provisões alimentares voltou a ser
central na agenda política internacional, por causa de crises
relacionadas, para além do mais, com as bruscas oscilações do preço das
matérias--primas agrícolas, com comportamentos irresponsáveis por parte
de certos agentes económicos e com um controle insuficiente por parte
dos Governos e da comunidade internacional. Para enfrentar semelhante
crise, os obreiros da paz são chamados a trabalhar juntos em espírito de
solidariedade, desde o nível local até ao internacional, com o
objectivo de colocar os agricultores, especialmente nas pequenas
realidades rurais, em condições de poderem realizar a sua actividade de
modo digno e sustentável dos pontos de vista social, ambiental e
económico.
Educação para uma cultura da paz:o papel da família e das instituições
6.
Desejo veementemente reafirmar que os diversos obreiros da paz são
chamados a cultivar a paixão pelo bem comum da família e pela justiça
social, bem como o empenho por uma válida educação social.
Ninguém
pode ignorar ou subestimar o papel decisivo da família, célula básica
da sociedade, dos pontos de vista demográfico, ético, pedagógico,
económico e político. Ela possui uma vocação natural para promover a
vida: acompanha as pessoas no seu crescimento e estimula-as a
enriquecerem-se entre si através do cuidado recíproco. De modo especial,
a família cristã guarda em si o primordial projecto da educação das
pessoas segundo a medida do amor divino. A família é um dos sujeitos
sociais indispensáveis para a realização duma cultura da paz. É preciso
tutelar o direito dos pais e o seu papel primário na educação dos
filhos, nomeadamente nos âmbitos moral e religioso. Na família, nascem e
crescem os obreiros da paz, os futuros promotores duma cultura da vida e
do amor.
Nesta tarefa imensa de educar para a paz, estão
envolvidas de modo particular as comunidades dos crentes. A Igreja toma
parte nesta grande responsabilidade através da nova evangelização, que
tem como pontos de apoio a conversão à verdade e ao amor de Cristo e,
consequentemente, o renascimento espiritual e moral das pessoas e das
sociedades. O encontro com Jesus Cristo plasma os obreiros da paz,
comprometendo-os na comunhão e na superação da injustiça.
Uma
missão especial em prol da paz é desempenhada pelas instituições
culturais, escolásticas e universitárias. Delas se requer uma notável
contribuição não só para a formação de novas gerações de líderes, mas
também para a renovação das instituições públicas, nacionais e
internacionais. Podem também contribuir para uma reflexão científica que
radique as actividades económicas e financeiras numa sólida base
antropológica e ética. O mundo actual, particularmente o mundo da
política, necessita do apoio dum novo pensamento, duma nova síntese
cultural, para superar tecnicismos e harmonizar as várias tendências
políticas em ordem ao bem comum. Este, visto como conjunto de relações
interpessoais e instituições positivas ao serviço do crescimento
integral dos indivíduos e dos grupos, está na base de toda a verdadeira
educação para a paz.
Uma pedagogia do obreiro da paz
7.
Concluindo, há necessidade de propor e promover uma pedagogia da paz.
Esta requer uma vida interior rica, referências morais claras e válidas,
atitudes e estilos de vida adequados. Com efeito, as obras de paz
concorrem para realizar o bem comum e criam o interesse pela paz,
educando para ela. Pensamentos, palavras e gestos de paz criam uma
mentalidade e uma cultura da paz, uma atmosfera de respeito, honestidade
e cordialidade. Por isso, é necessário ensinar os homens a amarem-se e
educarem-se para a paz, a viverem mais de benevolência que de mera
tolerância. Incentivo fundamental será « dizer não à vingança,
reconhecer os próprios erros, aceitar as desculpas sem as buscar e,
finalmente, perdoar »,7 de modo que os erros e as ofensas possam ser
verdadeiramente reconhecidos a fim de caminhar juntos para a
reconciliação. Isto requer a difusão duma pedagogia do perdão. Na
realidade, o mal vence-se com o bem, e a justiça deve ser procurada
imitando a Deus Pai que ama todos os seus filhos (cf. Mt 5, 21-48). É um
trabalho lento, porque supõe uma evolução espiritual, uma educação para
os valores mais altos, uma visão nova da história humana. É preciso
renunciar à paz falsa, que prometem os ídolos deste mundo, e aos perigos
que a acompanham; refiro-me à paz que torna as consciências cada vez
mais insensíveis, que leva a fechar-se em si mesmo, a uma existência
atrofiada vivida na indiferença. Ao contrário, a pedagogia da paz
implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança.
Jesus
encarna o conjunto destas atitudes na sua vida até ao dom total de Si
mesmo, até «perder a vida» (cf. Mt 10, 39; Lc 17, 33; Jo 12, 25). E
promete aos seus discípulos que chegarão, mais cedo ou mais tarde, a
fazer a descoberta extraordinária de que falamos no início: no mundo,
está presente Deus, o Deus de Jesus Cristo, plenamente solidário com os
homens. Neste contexto, apraz-me lembrar a oração com que se pede a Deus
para fazer de nós instrumentos da sua paz, a fim de levar o seu amor
onde há ódio, o seu perdão onde há ofensa, a verdadeira fé onde há
dúvida. Por nossa vez pedimos a Deus, juntamente com o Beato João XXIII,
que ilumine os responsáveis dos povos para que, junto com a solicitude
pelo justo bem-estar dos próprios concidadãos, garantam e defendam o dom
precioso da paz; inflame a vontade de todos para superarem as barreiras
que dividem, reforçarem os vínculos da caridade mútua, compreenderem os
outros e perdoarem aos que lhes tiverem feito injúrias, de tal modo
que, em virtude da sua acção, todos os povos da terra se tornem irmãos e
floresça neles e reine para sempre a tão suspirada paz.
Com esta
invocação, faço votos de que todos possam ser autênticos obreiros e
construtores da paz, para que a cidade do homem cresça em concórdia
fraterna, na prosperidade e na paz.
Vaticano, 8 de Dezembro de 2012.

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